A Umbanda em minha vida.


15 de novembro de 1908 – aprendi há pouquíssimo tempo- foi o dia em que a Umbanda foi declarada como a nova religião brasileira, pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, por meio do médium Zélio de Moraes. Eu conheço a Umbanda há apenas um ano, mas nada mais justo do que prestar uma homenagem, singela que seja.
Eu cresci ouvindo a sociedade falar da Umbanda de forma pejorativa, principalmente sobre sacrifício de animais. Porém, sempre conheci pessoas que são dessa religião, pessoas muito boas, e isso fazia com que eu me questionasse a respeito desses rumores. Eu sempre fui muito ligada às origens africanas: culturas, histórias, danças, batuques... Frequentei e desfilei em 2005 (dez anos antes de frequentar a Umbanda) no Afoxé Ile Omo Dada, e era encantada, apaixonada por tudo aquilo. Sempre amei tranças e tive a oportunidade de fazer esse penteado: o cabelo inteiro de trancinhas finas. Era um lugar cheio de amor e boas energias. Um dia, um senhorzinho segurou meu rosto com delicadeza e disse, transbordando carinho: “nossa branquinha do reduto afro”. Me emocionei só de lembrar. Eu adorava ir aos ensaios; foi um tempo de uma troca linda e muito aprendizado. Aprendi o que significavam os passos da dança, por exemplo: a representação de uma lavadeira no rio. Um mundo inteiro a ser descoberto; uma cultura riquíssima que foi marginalizada e teve o seu acesso obstruído pelo preconceito e racismo arraigados nas gerações.
No que diz respeito às religiões, eu sempre fui uma pessoa de muita fé. Minha mãe me ensinou algumas orações e a rezar todas as noites; porém eu tinha algumas manias que ‘inventei sozinha’, quando criança. Eu sempre tive um lugarzinho para deixar algumas imagens. Anjo, Jesus, Nossa Senhora. Vela, terço, incenso e pedrinhas. E também duendezinhos e maçãs para eles. Doces para Cosme e Damião. Na parede, o Daimoku. E acreditava em signos e astrologia. Sempre amei o mar e Iemanjá (a única Orixá que eu conhecia).
Meu pai é um homem que acredita em Deus, como uma força superior. Mas nunca conversamos sobre religião. Minha mãe me ensinou a rezar mas nunca fomos à igreja nem a lugar nenhum. No entanto, eles nunca me impediram nem mesmo se incomodavam quando eu queria conhecer alguma religião. E eu, desde criança sentia falta disso. De algo. Então minha infância foi assim: Ia à paróquia com uma tia minha, nas férias; ia a reuniões budistas com minha madrinha, na outra parte das férias; conversava com um casal de amigos da família, que é evangélico e me deu uma Bíblia linda para jovens, que eu lia; fui convidada por uma vizinha americana a ir em uma reunião da igreja dela, a protestante; mais alguns dias de férias e eu via minha vó rezando as novenas com seu tercinho na mão; e a outra vó que estudou sobre o espiritismo de Kardec mas também me levava nas novenas e vias-sacras.  E gostei de todas elas, verdadeiramente. Mas, sendo criança, não frequentava nada sozinha, então esses momentos ficavam apenas para as férias. Enquanto isso, eu seguia fazendo minhas orações, tudo misturado e com muita fé, mas não inabalável ao ponto que indagar sobre o porquê Deus, sendo tão bom, permitia tantos acontecimentos maus, o porquê tantas crianças na miséria, guerras e sofrimento. Eu tinha fé, mas não tinha orientação necessária. As únicas orientações que eu recebia era nesses momentos de férias, que eram poucos e esporádicos.               
Além disso, nunca aceitei bem, até então, a morte. Isso para mim significava a perda das pessoas e eu reagia muito mal. Em 2005, 5 amigos sofreram um acidente de carro, e três desencarnaram. Questionei Deus e sua justiça. Minha mãe me emprestou o livro Nosso Lar (ela sempre teve essa crença no espiritismo, mas nunca havia me passado, talvez pelo meu pai), mas eu não consegui ler mais de duas páginas, me acabando em lágrimas. Devolvi o livro. Em 2006 desencarnou uma criança muito próxima a mim, muito chegada a mim e eu a ela. Perdi a linha. Derrubei meu quarto. Fiquei de mal com Deus. Questionei tanto, o porquê uma criança que não teve tempo de fazer nada para se prejudicar, nem prejudicar aos outros, ter que passar por uma doença como o câncer, sofrer tanto e morrer. Aí já era demais. Eram inúmeras perguntas sem resposta. Então uma prima minha, um pouco mais distante, estava conversando comigo por telefone e eu lhe fiz essas perguntas. Ela é espírita e começou a me responder, dentro da visão espírita. E eu comecei a me acalmar, aceitei bem a explicação dela. Para mim, confortou mais e tinha lógica. Mas não fui além... Sempre fui de trabalhar e estudar muito e não tinha tempo para mim. Quanto mais o tempo passava, mais falta eu sentia de cuidar do meu espírito, mas nunca tinha tempo. Fui ficando angustiada, mas eu estava sempre em segundo plano. 2013 e 2014 inteiros foi tentando ir em algum centro espírita. Os horários não batiam. 2015 começou e eu já não estava mais aguentando ficar sem um norte, sem orientação. Mesmo rezando e orando em casa, eu não tinha conhecimento, nem estrutura. Passei o ano tentando, até que em outubro eu consegui ir, pela primeira vez em um “centro espírita”, que na verdade é ecumênico e tem também a gira de Umbanda. A proposta inicial da Casa já era maravilhosa, e ia de encontro com o que eu vivi: o respeito a todas as religiões; o saber que não importa qual religião você siga, o que importa é o amor, a sua melhora, a sua evolução.
Eu cheguei ali com um casal de amigos que já frequentavam a casa há algum tempo. Estava tímida, ansiosa, e sim... um pouco receosa, por tudo o que eu ouvi sobre a Umbanda, e também por não saber como seria; eu acreditava sim, mas não sabia se lá era um lugar sério, se os médiuns recebiam mesmo as entidades (peço perdão a todos!!!). Mas ao mesmo tempo, eu sentia uma coisa boa dentro de mim. Ao chegar lá, minha primeira surpresa: um ambiente agradabilíssimo, clarinho, com imagem de Jesus e de santos (eu não sabia sobre o sincretismo) e também de entidades e Orixás. Depois, uma mensagem foi passada por um dos trabalhadores. A mensagem foi linda. As pessoas lá falavam em Deus, Nossa Senhora, Nosso Senhor Jesus Cristo. E começou a gira. Os atabaques me arrepiaram, os pontos me emocionaram. A sensação era de que eu estava em um universo paralelo. E aquela ansiedade aumentando. Conversei com um Baiano e no fim não tinha mais o que duvidar... Eu estava em casa. As entidades, maravilhosas. Os médiuns, pessoas humildes, doces, dispostas a ajudar e ensinar. A casa, um ambiente e uma energia sem igual.
Descobri que a Umbanda é uma religião brasileira, de matriz africana, com base no espiritismo, de alcance popular. A Umbanda não sacrifica os animais. Não cobra pelas consultas. Não interfere no livre arbítrio de ninguém. Quem faz isso são médiuns e entidades mal-intencionados, que acabam prejudicando o nome dela. A Umbanda não muda as coisas para você, e sim, te muda para as coisas, e isso faz toda a diferença. A Umbanda te orienta à caridade, ao respeito, ao amor a todos sem distinção. Há um ano eu frequento a Umbanda, e há tanta gratidão dentro de mim. Pela casa, pelos dirigentes, pelos trabalhadores, pelas entidades. Minha vida mudou muito, mas não mudou em nada. Eu mudei, estou mudando. Aprendi a tirar a responsabilidade dos meus problemas de cima dos outros, e assumi-los. Aprendi que eu sou responsável pelas minhas ações e vou responder por elas; boas e ruins. Que se eu recebo bênçãos é por meu merecimento, no que se refere às minhas atitudes. Aprendi a me resignar diante dos desígnios de Deus (na verdade, estou aprendendo); aprendi que eu não tenho nada além do que eu preciso ter, que eu estou onde deveria estar, com as pessoas que eu deveria estar. Estou aprendendo a controlar meu orgulho; a perceber meus defeitos e tentar controla-los; estou aprendendo a perdoar; estou aprendendo tantas coisas com orientação e carinho. Encontrei na Umbanda a minha base, meu lar; encontrei pessoas que estão dispostas a ajudar a qualquer hora do dia. Eu me encontrei. E percebi que tudo aquilo que eu vivi não é o oposto à Umbanda; eu acreditava que uma religião complementa a outra, que elas pregam os mesmos valores, oram para o mesmo Deus, não importa que nome tenha; e a Umbanda me mostrou exatamente isso. Tudo é luz quando se faz com amor, respeito, caridade, fraternidade e tolerância.
Hoje, não me vejo sem a casa, sem as entidades, sem a Umbanda. Sou eternamente grata. Meu coração está cheio de amor.
Só tem um ano, mas foi o ano de maiores mudanças em minha vida. Não mudou nada. Mas mudou tudo.
Umbanda me trouxe luz, amor, fraternidade.

Comentários

  1. Parabéns pelo texto. Me identifiquei em muitos momentos!
    Hoje sou grata por ter conseguido acabar com todo preconceito incutido em mim e virar uma grande admiradora da Umbanda!
    Sou uma branquinha muuuiiito neguinha! rs

    Beijo grande!

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    Respostas
    1. Obrigada Gabi! A Umbanda é um caminho de muita luz né ?
      🙏 Hahahaha
      Eu também viu, eu sempre falei que eu nasci branca por engano !!😂
      Que possamos retribuir a ela tudo o que ela tem feito por nós !!!
      Um beijão!

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