O dom que Deus me deu, eu dedico a você II - 6 anos depois


Em 2013, dia 08 de março, escrevi um texto contando um pouco da minha tristeza sobre a morte do Chorão e também um pouco sobre minha devoção à banda.
Quase 6 anos depois, venho relatar como foi esse período para mim. Afinal, ele havia sido o cara que guiou minha vida, que não me deixou me afundar de vez na depressão, que me incentivou sempre a seguir em frente e acreditar. O cara que conversava com os fãs, que aconselhava, que colocava todo mundo para cima!
Eu preciso falar disso.

Para piorar, seis meses depois de sua partida, sofremos o baque de perder Champs, o querido baixista e "irmão" de Chorão. Aquela figura carismática, nem sempre tão presente nos bate-papos após os shows, mas sempre divertido. Aquele cara que pisava no palco e sua performance nos inflamava também. Um baita músico.

Quando a notícia do ocorrido com o Alexandre Magno Abrão chegou para mim, por meio do meu noivo na época (e agora ex), eu estava trabalhando, era de manhã. Enquanto eu passava pelos alunos da escola, eu ouvi: "...daquela banda Charlie Brown...", mais alguns passos, outro grupinho: "...o vocal..."
Sempre que eu ouvi algo sobre Charlie Brown, ou qualquer integrante da banda, era como se alguém estivesse falando meu nome! Passei por eles curiosa, pensando: "será que ele está pela cidade?"
Mas, chegando na secretaria da escola e com vários documentos para analisar (na época eu cursava Pedagogia e estava fazendo estágio obrigatório em administração escolar), me envolvi nos afazeres por uns cinco minutos, até receber a ligação. Meu (ex) noivo, cheio de dedos -pois sabia o quanto eu era fã- perguntou se eu vi o que aconteceu. Meu coração gelou.
*Não!
"Então, Pam... o Chorão..." -Meu pescoço começou a pulsar- "...foi encontrado morto"- ele disse isso bem devagar como se o baque fosse ser menor. "Pam, tu tá ouvindo? Pam, tu ta aí?"
*Como?
"Não sabem direito, acham que foi bebida, droga ou suicídio.(Silêncio) Tu tá bem?"
*Você tá zoando, né? (soltei um risinho nervoso)
"Claro que não, guria, tu sabe que eu não ia brincar com isso"
*É zoeira...
"Pam, não é!"
*Nossa, não dá pra acreditar...
Enfim.... voltei para os documentos com aquela informação remoendo na cabeça. Mas, acabei de perceber que não tenho na memória como foi que eu confirmei isso. Não me lembro se acessei pelo celular. Não me lembro mesmo...
Dois dias depois, a ficha começou a cair lentamente (quando eu escrevi o primeiro texto).
Após esse momento de desabafo, tudo sumiu. Quase nunca falava na banda, nem neles. Não ouvia mais as músicas. Quando tentava fazer uma coisa ou outra, a voz embargava, o olho se enchia e eu não conseguia.
Na minha rotina, foi fácil deixar para lá. Estava sempre sem tempo, sempre correndo... Para fazer os pendrives, bastava passar longe... DVDs e VHS com gravações de shows e programas, intocáveis.
Quando vinha vontade de escutar, eu até tentava, mas sem sucesso. Às vezes, ouvia a introdução da música, mas quando a voz dele surgia, pronto... desatava a tirar pois o sufoco que crescia dentro de mim era inenarrável.
Não sei explicar o motivo de taaanta comoção, mesmo sendo muito fã. Mas acho que era um dos ponto de identificação com ele: esses sentimentos sempre em 'exagero', sempre transbordando.... sempre fui intensa nesse sentido.... eu sempre gostava ao extremo, quando gostava.
Enfim... levei desse jeito por todos esses anos, totalmente alheia aos acontecimentos que envolviam Charlie Brown, Chorão...
Não que fosse tão fácil. O skate ficou para lá, mas toda vez que eu entrava em uma loja pra comprar um tênis, um agasalho... pronto! Alguma recordação surgia. Até hoje, mesmo não andando mais de skate, algumas peças no guarda-roupa se mantém.
Com o tempo passando, fui comentando alguma coisa ou outra sobre esse passado de fã. Algum show, algum momento mais marcante; mas sempre um pouco superficial. Mais um tempinho passou, ensinei minha sobrinha a desenhar o skatista no half pipe com o solzinho (semana passada veio essa recordação de 2016 no Facebook: a lousinha cheia de desenhos e esse, acompanhado de um "Charlie Brown Jr." em letra de grafiteiro).
Mais um tempo para eu começar a escutar algumas músicas. Não todas. Algumas pinceladas. Mas me obriguei a isso de início. Mesmo com as lágrimas descendo soltas, me forcei a ter força e escutar.
Até quando terminei meu relacionamento, foi tudo muito discreto... mas depois de uns meses, achei melhor 'divulgar' o término, para evitar encheção dos linguarudos da cidade, caso me vissem passeando... Para isso, postei apenas o trecho: "Um dia na praia a gente jurou ficar junto pra sempre, depois tudo mudou. Eram portas abertas, que depois se fecharam, o tempo passou e as coisas mudaram. Separaram a gente, as circunstâncias e as coisas..."
Em todos os momentos da minha vida, eles estavam presentes...
Ver algo eu ainda não conseguia, além de algumas fotos. Vídeos, jamais.
Aos poucos, foi ficando menos dorido.
Até que em uma "surf trip" com um primo e uns amigos em janeiro deste ano (há pouco mais de um mês), o assunto foi inevitável. Como gostamos de skate, logo meu primo puxou o assunto para mim, e consequentemente, para o Chorão e a banda. Consegui falar sobre e isso foi a chave para dar início ao fim do longo luto. Um amigo do meu primo, enquanto estávamos na estrada para encontrar praias com boas ondas, colocou a playlist do Charlie Brown. E descobri que foi ainda mais suave.
Quando voltei para casa, voltei pilhada: fui rever fotos antigas, as fotos de shows, peguei até o primeiro DVD deles e coloquei. Mas comecei a arrumar coisas para fazer, de modo que só ouvi, não cheguei a olhar para a TV, numa fuga escancarada. Num rompante, veio à tona tudo o que estava guardado. A saudade de ser fã daquela banda... as idas aos shows...
***eu era muito nova quando eles começaram, demorei para poder ir aos shows e quando estava com uns 18 anos, comecei perder a inocência e entender algumas letras, nas entrelinhas. Eu realmente acreditava que ele não se drogava (mesmo um baseado); só pelas coisas que ele dizia nos shows. Tardiamente, entendi certas referências e fiquei magoada. O Cd 'Tamo aí na atividade' me deixou bolada, não pela mudança musical que eu, leiga, identifiquei mas curti; mas pelo teor das letras... achei que estava 'ostentação' demais e para mim, isso não combinava com meu ídolo. Então veio o rompimento com todos da banda, só restando ele da formação original. Aquilo acabou comigo. Sem entender o que aconteceu, e com a internet não tão acessível, como é hoje com tantos meios de comunicação, achei que realmente ele estava esbanjando, ostentando, e colocando a grana a frente das relações. Somado àquela frustração causada pelo excesso de ingenuidade, fiquei 'de mal com ele'. Para mim, aqueles músicos eram o Charlie Brown, tanto quanto ele. Entrei numa bad. Nunca mais fui no show da minha banda preferida....nos meus shows preferidos...nunca mais tentei entrar por passagens proibidas, por seguranças mandões, nunca mais fiquei esperando eles na van, conversando com o motorista e mais uns moços que eu nunca soube quem eram, mas que me faziam rir contando coisas dos meninos da banda... nunca mais.
Depois, essa frustração foi acalmando, eu fui voltando a escutar, voltando a falar com orgulho que, no passado, eu era conhecida como "a filha do Chorão", mas nunca mais tive chance de vê-los no palco outra vez ***
Revi (voltando para janeiro/fevereiro 2019) as fotos que, naquela época, as pessoas mais falavam que eu parecia com ele.
Resolvi ir atrás de tudo relacionado a ele que saiu nesses últimos anos que sucederam seu desencarne: notícias dos músicos, da família, da Grazon, do filho, dos negócios.
Me lembro que, antes de me afastar de tudo, tinha sido informada sobre a dificuldade que a Chorão Skate Park estava passando e perigava fechar...até hoje eu não sabia o que havia acontecido com a pista.
Enfim, coisas assim que não fazia nem ideia de como estavam e eu resolvi querer saber; trazer tudo isso de volta pro meu mundo... Principalmente, sobre os músicos que eu tanto amava.
Descobri que o Xande tem uma filhinha agora, e minha mãe disse que se parece comigo (aaaah!),  e descobri também que a Grazon escreveu um livro: "Se não eu, quem vai fazer você feliz - Minha história de amor com Chorão".
O livro nos remete para aqueles lugares, para aqueles momentos, como se estivéssemos lá, acompanhando tudo como fantasminhas. Foi muito fácil visualizar o Chorão em todos aqueles momentos. Parecia que eu estava ouvindo sua voz, vendo seu jeito de falar, de gesticular, de sorrir! Foi incrível poder lê-lo. Dava para sentir as verdades ali, 'tudo' o que ela passou de ruim e de bom ao lado dele. Fiquei feliz que ela não omitiu sobre seu temperamento, pois quem conheceu ele um pouco mais, saberia que era uma romantização. Tenho certeza que ela foi fiel aos acontecimentos.
Ela merece todo o nosso carinho, e não o nosso julgamento. Foi um presente muito belo que ela nos deu, e sou muito, muito grata a isso.
(Nota do dia 27/02/2019: Estou lembrando de muitas coisas que eu havia simplesmente esquecido, que haviam sumido da minha memória. Momentos de shows, detalhes, camisetas que eu tinha, pulseira, várias coisinhas que, no processo do luto, eu acho, minha mente arquivou muito bem. Agora estou ganhando minhas lembranças de volta!)

Depois de ter escrito tudo isso, sinto um alívio maior. Não estou totalmente curada sobre; mas foi um grande passo dado. As coisas vão normalizar...dentro do possível.


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